Hoje tem Paladar e coluna Nhac, sobre jabuticaba. Exatamente sobre a casca. O título, dado pela redação, ficou perfeito: Joga as cascas pra cá! Veja lá no blog do caderno a edição completa.
Bem, já falei de casca de jabuticaba em vários outros posts, como neste:
http://come-se.blogspot.com.br/2012/11/jabuticabas-passas.html e naquele: http://come-se.blogspot.com.br/2010/12/jabuticaba-casca-em-compota.html
Aqui, o texto que mandei pro jornal, com fotos minhas. E, depois da receita, mais dicas de como usar as partes, com fotos minhas.
Jabuticaba - joga as cascas pra lá
É tentador explorar com palavras os sentidos ativados quando atolamos os dentes na massa suculenta e doce algo ácido de uma jabuticaba. Muitos cronistas e poetas já o fizeram. Portanto, sejamos pragmáticos.
Imagino que todo brasileiro já tenha visto uma jabuticabeira florida e depois frutificada. Quem não viu, coloque na lista, é obrigatório, afinal a Myrciariajaboticabaé cultivada em todo nosso território. É uma das árvores mais apreciadas para se ter em quintais e pomares domésticos, pela beleza da florada e gostosura dos frutos, bons de comer no pé.
Como outras fruteiras tropicais, a jabuticaba tem safra curta, apesar de duas por ano – na primavera e no verão -, e alta perecibilidade. Isto faz com que haja grandes perdas. De um modo geral temos pouca cultura de aproveitamento integral destas frutas, talvez pela abundância da safra que nos faz, de boca cheia, perder a razão e o senso de provisão. Gostamos de jabuticaba fresca, de preferência sabará ou pingo-de-mel, direto do tronco, primeiro o que tem e depois o que vem. Mas quem dá conta de comer tanto? E comprar na caixinha parece que perde metade da graça. O que não se perde nunca é o alto teor de antocianinas, compostos antioxidantes que conferem aos vegetais tons do vermelho ao azulado. É a mesma substância presente nas uvas escuras e nos vinhos tintos e que a gente aprendeu que faz bem para a saúde. No caso das uvas, a antocianina vai para o vinho enquanto que as cascas da jabuticabas costumam ir para o lixo, pois comemos a polpa.
A sorte é que não faltam pesquisadores para comprovar os efeitos benéficos da casca, para estudar melhores métodos de secagem e conservação e para inventar formas para aproveitamento alimentar, fitoterápico e cosmético. Por isto já encontramos por aí a casca da fruta liofilizada, barrinha de cereais colorida, a casca passa, aguardente, fermentado, vinagres, além dos preparos caseiros tradicionais como geleias e compotas.
Uma coisa que tenho feito quando me deparo com grande quantidade da fruta é desidratar as cascas e guardar para fazer chá com especiarias. Lavo bem as frutas, espremo uma a uma e uso a polpa para fazer suco. As cascas, abertas pela metade e bem espremidas, coloco sobre uma peneira forrada e coberta com voal e deixo secar ao sol. Ou, se o tempo está úmido, seco no forno, com fogo baixinho e a porta entreaberta. De vez em quando remexo para secar por igual. Quando está bem seca, sem perder a cor, guardo em saco de papel. Se restar alguma umidade, vai terminar de secar. Quando quero um chá de frutas vermelhas com especiarias, coloco um punhado de casca, um cravo, um pau de canela, uma rodela de gengibre e às vezes uma vagem de cardamomo e fervo. Bebo bem quente ou deixo gelar e tomo como refresco, com gelo e rodela de limão. Além de saudável, já que a antocianina continua ali, a bebida tem cor linda e sabor delicioso, perfumado e frutoso.
E esta infusão colorida de jabuticaba, mais ou menos apurada, com ou sem especiarias, pode ser usada de muitos jeitos: no lugar de água para hidratar o polvilho da tapioca, por exemplo, completando o vinho no vinho quente ou a cachaça no quentão, para fazer gelatina colorida e sorvetes mais nutritivos para as crianças e para fazer este sagu sem vinho que adaptei de uma receita alcoólica que aprendi com a chef Mari Hirata.
Se acontecer de você não ter tempo de aproveitar toda a jabuticaba na safra, enquanto ela está bem fresca, lave bem, congele a fruta inteira e você terá as cascas para aproveitar depois, além de poder chupar cada uma como sorvete encapsulado.
SAGU DE JABUTICABA
1,5 litro de água
½ xícara de sagu, de preferência de bolas grandes
500 ml de infusão de jabuticaba (feita com 1 xícara de cascas secas e água – ferva por 5 minutos)
½ xícara de açúcar
2 paus de canela
2 cravos
Cascas de ¼ de laranja e de ¼ de limão taiti, só a parte colorida, cortadas em tiras finas
Numa panela grande, coloque a água e leve para ferver. Junte o sagu e cozinhe por 1 hora (um pouco menos se usar o sagu tradicional, de bolinhas pequenas) ou até que fique com um miolo ainda opaco. Escorra e lave em bastante água gelada para tirar o excesso de goma.
Enquanto isso, junte a infusão de jabuticaba com o açúcar e as especiarias (canela, cravo e casca de laranja e de limão) e cozinhe por 2 minutos. Desligue o fogo, tampe e deixe em repouso por 15 minutos.
Descarte as especiarias da calda e leve-a novamente ao fogo. Quando ferver, junte as bolinhas de sagu e deixe cozinhar por mais alguns minutos ou até que fiquem completamente cozidas, sem o miolo branco. Escorra e reserve a calda. As bolinhas, coloque em forminhas individuais molhadas com água (pode usar xícaras de fundo abaulado) e resfrie sobre água com gelo ou em temperatura ambiente (na geladeira, endurece). Leve a calda ao fogo e deixe apurar até ficar com consistência de xarope. Desenforme o sagu e sirva com a calda fria.
Rende: 4 porções
Com a mesma infusão, você pode fazer gelatina e servir com compota.
A polpa, passada por peneira pra tirar as sementes, pode ir pra sorveteira sem açúcar, com um pouco da calda das cascas reduzida. Um delicioso sorbet que também pode ser servido com a compota.
A polpa sem as cascas e sementes podem ser batidas com um pouco de caldo de cana e água gelada pra fazer refresco de sabor incrível.
E pode ser usado para cozinhar tapioca, que fica como sagu. É só jogar uma colherada de creme e nhac!