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Galinsoga ou guasca, a erva-da-moda. Coluna do Paladar, edição de 09 de abril de 2015

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Na minha rua 
Hoje tem coluna Nhac no Paladar. Está lá no blog do caderno. E está aqui também: 


É impossível contar o número de espécies comestíveis, aromáticas e medicinais que crescem espontaneamente nos espaços de terra livre, mesmo nas grandes cidades como São Paulo.  A muitas  basta uma fresta de calçada ou uma rachadura de muro para que despontem seguras de suas raízes. 

Algumas destas plantas são aromáticas explícitas, como o epazote, conhecido também como erva-de-santa-maria, de perfume mentolado, que os mexicanos usam como tempero de queijos e feijões e nós apreciamos apenas como remédio. É fácil descobrir quando ela está presente entre outras ervas, pois é só tropeçar nele e vem o aroma. 

Outras são prolíferas, mas frágeis e discretas, tanto na aparência quanto no perfume. E por isto vão passando despercebidas enquanto invadem sorrateiramente canteiros, desafiam braquiárias e sufocam as flores mimosas do jardim.  Assim é a galinsoga (Galinsoga parviflora), uma importante erva ruderal, nome que se dá a espécies que crescem indesejavelmente nos ambientes urbanos, totalmente negligenciada por aqui até então. 
Mesmo que seja arrancada, pisoteada, não vai revelar o segredo que traz escondido, reservado só àqueles dispostos a conhecê-la mais profundamente e sem preconceitos por ser erva vulgar. No entanto, quando submetida ao calor, ligeiro que seja mas de preferência em líquidos borbulhantes, ela revela tudo de bom que tem para oferecer, a começar pelo perfume que transcende as paredes da cozinha.  E, depois, pelo sabor que se infunde pelo caldo, tornando qualquer água insossa em essência vegetal fragrante e saborosa.

Sempre ouvia falar da erva guasca usada na sopa colombiana ajiaco, como tempero indispensável e insubstituível.  Nunca acreditei, porém, que uma plantinha tão invasora e combatida na agricultura como erva daninha, inço ou planta nociva,  pudesse realmente ser aquela maravilha toda. Isto, até o dia em que avancei uma casa no universo da curiosidade e, em vez de só prová-la crua,  resolvi metê-la num caldo. E foi uma epifania quando, depois de uns três minutos, o vapor começou a invadir a casa. Era verdade, a erva cozida surpreende.  Quando crua, tem algo de alcachofra e de cogumelos no sabor. Mas, depois de aferventada, o perfume é encantador.  Por isto, um tanto dela cozida em água e um pouco de sal bastam se quiser fazer um econômico, complexo e delicioso caldo de vegetais para usar em sopas e risotos.

É quase certo que,  quando passar a reconhecer e colher por aí a galinsoga, alguém que lhe pegue em ação vá dizer: pensei que fosse mato.   Dizem que é mato a planta sem nome, mas a galinsoga tem nome de batismo em latim e uma porção de apelidos que só fazem aumentar o desprezo e a confusão. Então, já que muita gente está acabando de ser apresentada à espécie, vamos chamá-la de galinsoga, que é o nome científico do gênero e também o popular em vários países.

Outros nomes populares no Brasil são vagos e incluem:  brinco-de-princesa, fazendeiro, picão-branco, botão-de-ouro, guasca e galinsoga. Se tivermos que escolher, fiquemos com guasca e galinsoga, menos sujeitos à confusão com outras plantas de nomes parecidos. 
Nativa da costa oeste da América do Sul, hoje a erva está ampla e generosamente espalhada mundo afora.  Como tempero fresco ou seco é apreciada nos países andinos, mas também na Europa. Em Portugal, é chamada de “erva-da-moda”.  Na África do Sul, as folhas frescas ou desidratadas são consumidas como verdura ou tempero.

Há outras três espécies de Galinsoga, todas também comestíveis. E como todas elas têm o desenho muito característico, não há risco de confundir com outras plantas.  As flores são pequenas, como mini margaridas de miolo amarelo e pétalas brancas mínimas, e as folhas são levemente pilosas e macias, com bordas serrilhadas. Não vou me alongar na descrição quando você pode ir ao Google Imagens com o nome científico e tirar todas as dúvidas vendo fotos. Você vai reconhecê-la imediatamente quando encontrá-la nas ruas ou num vaso esquecido. 

O nome do gênero é homenagem ao espanhol Ignacio Mariano Martínez de Galinsoga (1776-1797), médico da rainha consorte Maria Luisa da Parma e fundador do Real Jardim Botânico de Madri. Vários nomes populares fazem referência ao “soldado da rainha”. E o nome da espécie parvifloraalude ao tamanho das flores, afinal parvusem latin quer dizer pequeno. 

Na Colômbia,  a erva, conhecida como guasca, é encontrada também desidratada e moída para temperar sopas, cozidos e carnes, principalmente de frango. E na medicina tradicional é requisitada por suas propriedades cicatrizantes e anti-inflamatórias – talvez você possa encontrá-la em casas de ervas.

Higienize com hipoclorito, como qualquer outra verdura
Algumas dicas para plantar, colher e usar:  se você ficou com curiosidade para usar a erva, não encontrou para comprar e não quer pegar a planta da rua, faça o seguinte: colha de onde encontrar um galho com flor seca, coloque em cima de um pires e espere que a flor se desintegre liberando as sementes, que parecem fiapinho. Agora, é espalhar pelo seu jardim ou pelos seus vasos e regar.  Só tome cuidado pois, se deixar, ela toma conta de tudo, especialmente se estiver em terra úmida com muita matéria orgânica.  De qualquer forma, é fácil de ser arrancada se for preciso. Quando brotar, use as folhas jovens cruas (menos aromáticas) em saladas.  Em qualquer estágio, todas as partes -  talos, folhas e flores -  são gostosas como verdura para sopas, recheios, omeletes e cozidos.  

Sequei a erva inteira (já higienizada) e só depois tirei os galhinhos
A erva seca, ótima para finalização de pratos

As folhas podem ainda ser secas em forno a 40ºC e trituradas para depois serem usadas como tempero em pratos com frango.  Diferente de condimentos como a salsinha que, depois de desidratada, fica como grama seca, sem sabor nem perfume algum, a galinsoga ganha ainda mais potência. É um ótimo tempero de mesa para finalizar sopas.  Para manter as folhas colhidas viçosas, coloque-as em vidro sem água e feche bem para que não percam umidade.

A sopa a seguir é um reconfortante prato único para as noites frescas de outono, inspirado na sopa colombiana ajiaco, porém, sem os acompanhamentos clássicos:  abacate, alcaparras e creme. Mas, fique à vontade.

A sopa fica muito boa 
SOPA DE MILHO, BATATA E GALINSOGA

2 dentes de alho finamente picados
1 cebola pequena picada
2 colheres (sopa) de óleo
1,5 xícara de grãos de milho verde 
1,5 xícara de batatas em cubos
2 colheres (sopa) de folhas de coentro
1,5 litro de caldo de frango 
1,5 xícara de peito de frango cozido e desfiado
Meia xícara de folhas de galinsoga 
Sal e pimenta-do-reino a gosto

Coloque numa panela o alho, a cebola e o óleo e leve ao fogo. Mexa até o tempero começar a dourar. Junte os grãos de milho, as batatas, o coentro e o caldo. Tampe a panela e deixe cozinhar por cerca de 20 minutos ou até que o milho esteja macio. Junte o frango e as folhas de galinsoga, tempere com sal a gosto e espere ferver. Se quiser uma sopa mais fluida, junte mais água quente e corrija o sal. Na hora de servir, tempere com pimenta-do-reino.


Rende: 4 porções 

Outras ideias

Com caldo de frango e batata doce: é só juntar caldo caseiro de frango, batata doce cozida e folhas de guasca. Talvez também uns pedaços de pimenta, pra quem gosta. Nhac!


Jaca verde com guasca:  esta é ideia do meu amigo Guilherme, do blog Matos de Comer . Fez um tipo de "jaca louca" e temperou com guasca. Fica com jeito de alcachofras. 

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