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Queijos de leite cru de Piracaia

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Piracaia fica na Serra da Mantiqueira, quase minas. E seus moradores são quase mineiros, falam uai e recebem bem. Tenho tido uma surpresa atrás da outra por lá ao comprar queijos. No supermercado Goyos (que insisto em chamar de Goya) já comprei um queijo meia cura delicioso feito num laticínio que ainda não consegui visitar. Embora seja de leite pasteurizado, ele se conserva bem fora da geladeira e sua textura cremosa vai ficando firme, lisa. 

Mas nada como um bom queijo feito de leite cru, feito em quase toda propriedade rural que tem lá umas vaquinhas. Ninguém vai ferver uma panelada de leite para fazer queijo. E eles são ótimos.  Um dia meu vizinho entrou na nossa chácara com o carro, oferecendo um queijinho. Achei que era uma brincadeira, pois nunca tinha visto o homem, ele abriu a porteira e subiu com o carro. Ele se apresentou, era o Fernando. Disse que tinha umas vaquinhas (além do eucalipal vizinho), tirava leite, fazia uns queijinhos. Comprei e gostei, fresquíssimo. Mas queria deixar maturar. Aquele estava tão bom que comemos rapidamente. Depois encomendei leite, não tinha dinheiro trocado, ele veio a cavalo no outro final de semana receber seus três reais pelos dois litros. Apareceu montado, com seus cachorros em volta, causando o maior alvoroço na Dendê, que nunca tinha visto bicho tão grande. E eu, nunca esperava receber visitas que chegassem pelo mato de trás de casa. Mas é um meio de ele cortar caminho, já que sua casa fica mais ou menos a um quilômetro. Este é o meu vizinho mais próximo. Resolvemos ir visitá-los, conhecer as vacas, o lugar onde o queijo era feito. Nice, sua mulher, nos contou que fazem pouco queijo, e não cheguei a ver a casinha que no momento não estava sendo usada, mas vi que criam porcos caipiras, soltos. E galinhas para o gasto. Nice não gosta de frango caipira, prefere os de granja, e ovos também. Diz que nem faz ninho para as galinhas, que botam no mato mesmo, que os porcos comem. Ô inveja! Pra gente da cidade, isto é quase uma ofensa, tão ansiosos por ovos caipiras de gema laranja. E eles têm cabras também, criadas soltas. Quem cuida, quem tira leite, quem vende o bicho, é o menino único, Diego, de 11 anos. Mas ninguém gosta do leite de cabra, não. Dão pros porcos. Eita porcos!  Mas pelo menos carne de porco, alimentado a pasto, ovos e leite de cabra,  agora sei que vou ter, pois de vez em quanto matam um. Saímos de lá com mais queijo, que este queria deixar maturar. Foi difícil resistir, mas valeu a pena. Não é espremido como vi fazerem na Serra da Canastra,  mas deixei escorrer bem o soro, apertei mais, e deixei naquela caixinha improvisada, lá em Piracaia. Com 15 dias, ele estava ótimo. Criou um mofinho branco por cima, o que me fez acreditar que, com mais tempo, poderá parecer um camembert, quem sabe? O sabor ainda é suave e a textura, um pouco furada, é muito boa. Da próxima vez vou querer mais, para deixar alguns por mais tempo maturando. 

E naquele dia em que comemos no boteco aisbaiano (pronto, já batizei), que fica exatamente no km 6 da estrada do Pião, ficamos sabendo do mineiro que faz o melhor queijo da região. Fica logo ali, vizinho. É no sítio do vovô. Seu Alcir não é o vovô nem o dono daqueles seis alqueires, mas arrenda a terra para dar pastagem às suas vinte vaquinhas que chama pelos nomes. Ele nos mostrou onde o queijo é feito - na sua própria cozinha, que estava limpa, organizada. Faz poucos queijinhos, que vende na cidade e no boteco do Seu João - que vende a 10 reais, o mesmo preço do Seu Alcir. Compramos um dele e queríamos comprar outro no próprio sítio, mas não tinha nenhum no momento. Não sobra, diz seu Alcir, todo mundo quer. Sorte que já tínhamos um garantido. Mas, conversa vai, conversa vem - e o mineiro gosta de prosear, falei que gostaria de ter o queijo maturado. Ele diz que todo mundo prefere o fresco, mas que se deixar até na geladeira, ele madura. Nisto, me mostrou um que estava lá esquecido na geladeira, que ninguém queria, que o povo ali gostava era do fresco mesmo - nada mineiro isto! Perguntei se ele não me vendia aquele, que estava lindo, amarelinho, ligeiramente abaulado como um mini queijo suíço, já que ninguém queria.  Disse que não, cruz credo, imagine vender um queijo ali esquecido, que me dava de graça, assim eu não ia voltar pra reclamar depois caso não prestasse. Não adiantou insistir. Levei o queijinho de graça e ainda um monte de mangas que estavam se perdendo no pé e ele fez questão de nos dar. "Uai, é até bom que oceis levem daqui, porque cai tudo no chão, e fica uma moscarada. Ontem foi bom que caiu uma chuvarada, sô, que a enxurrada varreu pro córguinho toda a mangada que azedava aí no chão".  Os dois, o fresco e o curado, estavam divinos de bom. Queria fazer receitas, ver como derretem, mas levei ao piquenique e todos gostaram muito.  Pergunte se sobrou alguma migaia. 

O grande, do Fernando vizinho e os outros dois, fresco e curado, do Seu Alcir

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