Quando começamos a melhorar aquele espaço a que demos o nome de horta, e que para sermos corretos estaria mais para um jardim de utilidades, fomos falar com os vizinhos do muro verde. Eles autorizaram a limpar mas não imaginavam que pegaríamos na enxada pra valer e pra deixar o espaço realmente mudado. Quando perceberam a movimentação vieram reclamar. Disseram que se plantassem árvore iriam cortar e que não deveríamos plantar absolutamente nada grudado no muro deles. Argumentei: mas e se plantássemos capim santo (sempre ele, santificado seja)? Não, vai juntar lixo, vai tapar a saída d´água. - Mas e se plantarmos então hortelã que é rasteirinha? - Deus me livre cheiro de hortelã no nariz, não gosto nem de quibe. - Mas, mas, mas... Não teve acordo.
E aí, aos poucos os cosmus da horta foram dando flores, sementes. Aos poucos fomos mantendo aparada a grama beirando o muro ao mesmo tempo que eu ia, como quem não quer nada, como se fosse coisa espontânea, espalhando sementinhas de cosmus bem rentes ao muro. Aos poucos foram abrindo florzinhas e mais florzinhas. E o hoje torna o caminho tão agradável.
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Antes era assim. Veja o canteiro onde hoje plantamos capim santo - foto lá em cima (era tomado de braquiária em moitas) |
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O caminho hoje. E os vizinhos não reclamaram mais. |
Com o boato de que havia moradores contra a horta, tomei coragem, chamei minha vizinha de parada e lá fomos nós bater na casa do muro verde para saber se estava tudo bem, se estávamos incomodando, se estavam chateados com a horta. Qual foi nossa surpresa quando a moradora disse que não, que estava tudo certo, não incomodava em nada. Ufa! Só tinha um problema.. Putz, lá vem. - Vamos reformar o muro e talvez tenhamos que mexer um pouco nas flores, mas o pedreiro já disse que vai dar pra protegê-las com plástico. Saímos de lá aliviadas, felizes.
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O poste com a lixeira e o caminho que não havia |
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O poste com a lixeira (escondida) e cisterna e o caminho com grama e flores |
Outra situação: cheguei em Euclides da Cunha, Bahia, para dar oficinas para as merendeiras e a primeira coisa que vi foi um jardineiro capinando todas as flores. Comecei a fotografar e achei o homem com cara de bravo. Parei de tirar fotos e fui conversar com ele. - Eu só estava tirando fotos porque acho tão bonitas estas flores. Por que está arrancando? - Não é flor, não. É mato. - É mato, mas tem flor e é tão bonita, tem tanto dela por aqui. Acho linda. - Ié? ele indagou. - Embeleza a escola, disse eu. - É, até que é, mas pediram pra tirar e eu obedeço, né? - O senhor podia deixar ao menos um canteirinho... - Não, pediram pra deixar o terreno limpo.
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Este páteo era forrado de flores que foram substituídas pela nudez escancarada |
E ele continuou a capina por todo o período em que estive lá. No dia seguinte, quando estava na cozinha, alguém me chamou. - Estão chamando a mulher. É o jardineiro. Fui até a porta e o jardineiro, fiquei sabendo que se chamava Pelé, já foi cumprimentando e contando a novidade feliz. - Ó, eu falei com o homem que a mulher gostava das flozinhas e ele deixou ficar este canteirinho. E não é que ficou bonito mesmo? - Fiquei emocionada, claro.
O Pelé começou a achar bonitas as florzinhas de
Turnera subulata, que em Uauá é conhecida como "malva branca", e em Euclides, de mato. Todas as merendeiras a conheciam como mato.
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Pelé disse que achou bonito o canteiro que conseguiu deixar graças ao meu pedido |
Perguntei pra elas a diferença de flor e mato. - Mato é a planta que não tem nome, igual pé de pau. Em alguns lugares é chamada também de chanana. Expliquei que toda planta tem nome e sobrenome, o que acontece é que às vezes a gente não sabe.
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Arrumei o beiju com as flores de mato e o café antes de começarmos os trabalhos |