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Coluna do Paladar de hoje: Cuca de uva

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FOTO: Felipe Rau/Estadão

Cuca fresca – e fofa, e crocante…

  • Publicado originalmente no Jornal O Estado de São Paulo, Caderno Paladar, de 20 de dezembro de 2012e no blog do Paladar. 

    Por Neide Rigo
Corre solto Brasil afora um Natal diferente deste que querem nos vender. O Natal do cuscuz à paulista, do escaldado de peru, do pato no tucupi, do matambre recheado, do marreco assado, do empadão, da leitoa, do frango com farofa de miúdos, das bolachas em forma de estrela. Mas é muito mais fácil padronizar os hábitos que atendê-los em suas diferenças. Então, que se coma brioche (ops!, panetone – com frutas tingidas e resistência forçada para durar até o inverno).
Gosto daquele Natal que ainda vive por aí, pelo menos na lembrança de muita gente, na minha, na da família do Paraná e na de meus amigos gaúchos, cujo pré-preparo começa com a arrumação da casa para deixá-la um brinco. Na véspera, os meninos buscam musgo para disfarçar a lata do pinheiro ou para fazer o presépio que vai acomodar personagens moldados com barro cru e pode ser verdejado também com grãos de arroz germinado. O presente é um item importante só para as crianças, que ainda conseguem se alegrar com bolas coloridas ou bonecas que não falam nem comem. Talvez isso tenha ficado para trás.
Na cozinha reinam as mulheres e, para garantir a provisão para os dias de festa, as latas velhas e muito limpas de biscoito começam a ser enchidas com bolachas cortadas em formato de estrela, ou rosquinhas de farinha de trigo ou polvilho. Em pleno verão, roscas doces repousam cheirosas sob cobertores para levedar na calma escura. E, direto do forno, rumo a toda a vizinhança para atiçar as vontades, vapores de cucas de frutas assando. E é aí que quero chegar. Nas cucas, nas frutas e nas uvas.
Minha mãe não comprava panetone e quando começou a aparecer era um só, presente da firma do meu pai. Mas ela fazia e ainda faz cuca, quase sempre de banana, para aproveitar a penca que amadurece, e às vezes de maçã, mas nunca de uva. Junto das frutas de época, como pêssego, melancia e manga, as uvas niágara eram para a sobremesa do almoço, ao natural. Eram compradas em caixas. Vinham rosadas, cobertas com fina camada de cera translúcida, bojudas e cheirosas, como acontece ainda hoje, embora já não pareçam tão saborosas. Quando passávamos as férias no sítio dos avós, a videira se enchia de cachos maduros com doçura de mel justo nos dias de festas, como presentes de Natal, e baciadas iam à mesa, apesar do ataque prévio das crianças ao parreiral provando uva a uva para eleger o melhor cacho.
Mas, para você não achar que vivo de reminiscências, o vinho de hoje é muito melhor que aquele que se batizava com água, açúcar e gelo para ficar bom. Temos muito mais opções de boas comidas para variar o cardápio, e não guardo nenhuma boa lembrança dos gritos do porco.
Coisa boa é que neste ano tive a sorte de ter uma boa safra de uvas niágara agarradas à cerca, no meu quintal, sem agrotóxicos. E não pense que estou só. Andando pelo bairro, já vi várias parreirinhas de jardim carregadas. Com a safra, resolvi fazer a cuca cuja receita aprendi com d. Iraci Berghan, que faz para vender, em Ivoti (RS), onde cuca é o panetone de todo dia e será o meu de Natal, com adaptações. É uma cuca fofa, com cobertura refrescante, ácida e doce.
Os gaúchos descendentes de alemães, no Rio Grande do Sul, têm um dialeto próprio, pouco compreendido por brasileiros e até mesmo pelos germânicos, mas a palavra cuca é uma exceção, pois já foi incorporada ao vocabulário gastronômico de quase todo o País, com várias opções de cobertura e até em versões modernas feitas com fermento químico em vez da levedura. Trata-se de uma corruptela do nome original cheio de consoantes. O bolo com farofa crocante é conhecido na Alemanha como streuselkuchen, sendo que streusel é a farofa – mistura de manteiga, açúcar e farinha – e kuchen quer dizer bolo. Streuselkuchen virou kuchen – ou cuca.
Cuca de Uva 
Ingredientes
30g de fermento biológico fresco
250g de açúcar
12g de sal
750 ml de leite (ou metade leite, metade água)
100g de manteiga sem sal, em temperatura ambiente
2 ovos
1 colher (sopa) de suco de limão 1,25 kg de farinha de trigo
Raspas de um limão taiti
Para a farofa
1 xícara de açúcar
1 xícara de farinha de trigo
100g de manteiga derretida
Para a cobertura
1,5 kg de uvas escuras (niágara ou isabel), lavadas e secas
Modo de fazer
Numa tigela grande, dissolva o fermento com o açúcar e o sal no leite. Acrescente a manteiga, os ovos e o suco de limão.
Junte a farinha, aos poucos, mexendo com colher de pau, até ficar difícil de mexer. Passe, então, a trabalhar a massa com as mãos enfarinhadas, juntando as raspas do limão e o resto da farinha, aos poucos, só até formar uma massa homogênea e muito macia. Não deve ser firme como a de pão nem mole como de bolo. Também não precisa ser excessivamente trabalhada. Cubra com pano e deixe crescer até dobrar de volume.
Faça a farofa: misture com as mãos os três ingredientes até formar uma farofa úmida.
Unte uma forma retangular 45 por 32 centímetros com manteiga e enfarinhe. Ajeite a massa no fundo da forma escolhida, cubra com uvas (pode pressionar um pouco para que entrem na superfície da massa) e espalhe por cima a farofa. Deixe crescer novamente até dobrar de volume e leve ao forno preaquecido (cerca de 200°C) e deixe assar por cerca de 1 hora ou até que a farofa fique dourada por cima. Espere amornar, desenforme e espere esfriar caso queira embalar pedaços para dar de presente ou guardar na geladeira por até uma semana. Para ter pedaços mais regulares, para dar de presente, melhor assar em forma retangular.


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