Se quiser, veja antes:
http://come-se.blogspot.com.br/2013/07/mala-cheia-de-goiania.html
Logo no primeiro dia de expedição fomos apresentadas a todo jeito de comer goiano concentrado num só lugar. Fazia tempo que não vivia uma coisa assim - o prazer de ter tanta comida boa junta.
Se você é goiano e não conhece o restaurante Popular, corra lá. E quem é de fora, corra mais rápido ainda, que é um jeito intensivo de absorver Goiás sem sair do lugar, com a cabeça voando pra nossos rincões rurais instalados no imaginário gustativo. É uma grande casa de vó, uma oficina de sabores, com mesas entre os fogões, gente cortando abacaxi num canto da mesa, alguns pratos sendo juntados no outro canto, enquanto batatas fininhas vão saindo crocantes da gordura quente a todo momento e tachos de compotas apuram a calda às vistas de quem come.
Dona Maria de Lourdes Salomão, a proprietária, cuida de tudo com esmero. Toda bem arrumada, com vestido impecável, acompanha de perto cada detalhe da casa de 35 anos. Na cozinha com panelões de alumínio grosso brilhando sobre fogões industriais (como goianos gostam de panela de alumínio tinindo de brilho - eu também), os funcionários são todos alegres, trabalham sem atropelos e parecem ter Dona Lourdes como uma querida. O garçom contratado mais recentemente tem 4 anos de emprego e diz que aquilo pra ele é uma grande família, uma grande escola, que dona Lourdes ajuda todo mundo, que é uma verdadeira mãe para todos. Já viram isto num restaurante de 300 lugares que serve até mil refeições por dia? E tem o gentil (e eficiente) Jones, que atende a todo mundo treinando alegre seu inglês.
O nome popular é porque fica no Centro ou Bairro Popular, mas também porque tem este jeitão simples do comer bagunçado, familiar, tudo junto, direto da panela ou em travessinhas, de uma lindeza tão brasileira nas cores dos legumes cozidos no ponto certo, no brilho das carnes ainda quentes e na variedade de texturas e formas - a panelada de frango tem pés e pescoços, e por que não?
É como naqueles grandes almoços de família em que a gente come sem vergonha de chupar ossos, em que estica as mesas com tábuas e cavaletes ou cria ambientes extras nos puxadinhos para acomodar tios-avós e crianças.
Assim é o restaurante Popular. Quem quer, pode pegar direto da panela, mas também há opção pelo modo tradicional que está se perdendo em Goiás, que é o "comercial". Nada a ver com o nosso comercial que consiste geralmente em arroz, feijão, carne, salada e batata frita. O comercial goiano deveria se chamar "banquete goiano" pois me fez lembrar o banquete chinês em que vários tipos de comida gostosa chegam à mesa todos juntos, dispostos em travessas. Quiabo, jiló, abobrinha, linguiça, omelete, ovos fritos, guariroba, batatas fritas, frango caipira, carne de porco, milho refogado, feijão, creme de milho, pamonha frita, disco, bolinho de arroz, galinhada, arroz de pequi etc. Mesmo não tendo optado por este sistema e mesmo já estando com prato cheio, não parava de chegar à mesa outras gostosuras: batatas chips (feitas ali), linguiça com cebola, fresquinha, omelete com queijo divino de bom, abacaxi cortado e devo estar esquecendo algo. O suco, você pede em jarras: tamarindo e laranjada foram o que experimentamos. Laranjada não é coisa familiar, que mãe faz pra render a fruta? Nunca tinha visto laranjada (laranja+água e açúcar) em restaurante e estava deliciosa. A sobremesa completa o banquete. Vários doces, de leite, de goiaba, de banana, ambrosia, pudins, queijos e compotas de fruta a escolher.
Antes de irmos embora, demos uma circulada pelo restaurante. Num puxadinho ao lado da cozinha grande, funcionava uma outra cozinha de apoio, onde talhava no fogo a ambrosia com 50 litros de leite e repousava a rabada do dia seguinte, já limpa de gorduras, separada por tamanho e bem temperada - tudo embalado caprichosamente. Uma mesa-jirau servia de apoio para secar as panelas ao sol no quintal, onde funcionários descascavam cenouras e outros descansavam do almoço. E, como na casa da gente, o pouquinho de quiabo que restou na panela recebeu um ovo por cima, a abobrinha virou virado e tudo isto ali, na frente do cliente, jeito nosso às claras. A receita de cada prato, se pedir, as cozinheiras entregam tudo com paciência e sorriso na cara.
Tudo isto a preço popular, claro. Só não ornou a gôndola de inox para saladas...
Restaurante Popular: Rua 72, 524. Centro de Goiânia. Tel. 3224-6150
Veja algumas fotos:
Pela fachada, a gente não dá nada |
Feijão tropeiro (ou virado?) |
Frango caipira, com pé e tudo a que temos direito |
Gueroba |
Jiló |
Linguiça caseira acebolada |
Milho refogado |
Abobrinha |
Galinhada com pequi |
Carne de boi |
Bolinho de arroz |
Carne de porco |
Disco (bolinho de carne moída empanado e frito) |
Quiabo |
Pimentas a escolher |
Doces de frutas - ah, esta goiabada! |
Panelas ariadas, prontas pra começar de novo |