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Quinta sem trigo: massa versátil de polvilho com queijo

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Citei esta massa quando mostrei os presentes dos amigos de Fortaleza, Hermano e Manoela e o que cozinharam aqui em casa.  Também mostrei a massa quando falei de Fortaleza, onde, na casa deles, comi um tipo de beiju-pizza de frigideira feito com ela. Foi Hermano quem inventou de modificar a massa de pão de queijo para cozinhá-la no fogo. Já repeti a massa, mas também fiz como ele, sem medidas, pois o ponto é dado pelos ovos.

Basta misturar o polvilho já hidratado em um pouco de água, ou goma já pronta para tapioca, com ovos até formar uma massa pegajosa. Aí é só juntar temperos e queijo ralado a gosto. O queijo que tiver e o tempero que quiser.

Hermano costuma fazer a massa numa frigideira como um grande beiju ou panqueca ou pizza, a depender do que vai acompanhar. Na casa deles comi a delícia coberta com queijo e ficou como uma pizza. Aqui em casa,  Hermano resolveu usar minha frigideira de ferro para takoyaki, que comprei no bairro da Liberdade, não sei mais em que loja. Fez a massa com uns pedacinhos de queijo manteiga e pimenta e cozinhou em fogo super baixo, virando a massa com palitos,  para cozinhar por igual.  Os meus, fiz sem pimentas e usei 70 g de queijo manteiga para 3 ovos.  Se não tiver esta frigideira, é só fazer mesmo como pequenas panquecas. E, seja lá que frigideira escolher, não precisa untar, pois esta mistura de polvilho com ovo solta-se facilmente da placa quente, mesmo que não seja antiaderente.

E com a massa você pode ainda ir brincando na frigideira fazendo riscos e formar uma panqueca rendada. A Dendê preferiu os bolinhos redondos e bem recheados.  Espero que também explore a massa e me conte como ficou.
 
Estes são os meus, mais branquinhos, mas gostosos. Dendê está de olho
Vejam aqui algumas fotos da massa em Fortaleza e aqui em São Paulo.

A massa nasce assim. A partir do polvilho já hidratado
como se fosse fazer tapioca

Hermano mostrando a consistência da  massa
Na frigideira 
Com queijo e outros temperos
Com cobertura
Virando os bolinhos na frigideira de takoyaki
Brincadeira minha com a massa 


Convite pra mutirão da horta comunitária City Lapa

Azeite e manteiga de trufas. Ou quase.

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Os amigos Hermano e Manoela, de Fortaleza, trouxeram uma preciosidade na mala e estavam eufóricos com a descoberta. Já andaram pela Europa, já provaram do bom e do melhor e eis que um dia descobriram como fazer um azeite e uma manteiga que ficassem idênticos àqueles produtos estrangeiros perfumados com trufas brancas (muitos, aliás, com essência de trufas, não se iluda). Para isto, usaram cogumelos secos chilenos, os Boletus luteus, chamamos simplesmente de funghi secchi por aí (funghi secchi quer dizer cogumelos secos e podem ser de várias espécies). E alho que só aromatiza levemente. 
  
Mas o fato é que o azeite trouxeram na mala e ficou de presente. Já a manteiga, Manoela viu que eu tinha os tais cogumelos na despensa e resolveu fazer para usar no macarrão e me deixar um pouco.  Enquanto eles reinavam na minha cozinha, eu trabalhava no escritório e não vi o preparo. Sei, no entanto, que os cogumelos foram secos (mais secos ainda, até que ficassem quebradiços) no forno, espalhados numa bandeja. E depois foram triturados no liquidificador. A manteiga que ela usou foi uma do tipo ghee que eu havia acabado de fazer com a nata do leite que trago do sitio e estava deliciosa. Temperada com o pó de cogumelos, então, ficou divina.  Mas pode ser qualquer manteiga. Hermano acrescentou ao macarrão com cogumelos colheradas dela e, se você conhece azeite de trufas e gosta, vai ficar gostar ainda mais desta criação. Tem realmente sabor de trufas (vá lá, trufa é também um cogumelo, só que subterrâneo)

Como sobrou só um pouco da manteiga, usei ontem num macarrão de tomate (na massa) caseiro que preparei rapidamente. Só cozinhei a massa, escorri, deixei um pouco da água na panela e emulsionei com uma colherada de manteiga de cogumelos. Espalhei por cima um pouco de casca de limão-cidra e Nhac! 

Bem, agora passo a palavra a eles, que explicam como fizeram cada uma das delícias. 


Azeite e Manteiga de cogumelos secos
Por Hermano José Maia Campos Filho e Manoela Silva
"Quanto ao cogumelo, aqui achamos com o nome de funghi secchi ou funghi chileno. 

A manteigaé o cogumelo seco - seco no forno baixo de preferência ou uma chapa também com fogo baixo -  e batido no liquidificador ou processado para ficar em pó, mais manteiga, mais alho ralado. Proporção aproximada, 200 g de manteiga com sal, 25 g de cogumelo, 1 ou 2 dentes de alho.

Para o azeite: é só pegar uma garrafa de azeite, tirar a tampa e colocar 1 a 2 dentes de alho (sem a casca), e completar a garrafa com pedaços de cogumelo seco. Guarde a garrafa ao abrigo de luz por pelo menos 1 mês. Quanto mais cogumelo e tempo, mais intenso fica. Aquele que levamos pra você já tinha pelo menos uns 4 meses.

O macarrão foi bem simples também. Refogamos bem os cogumelos com alho e pimenta vermelha (acho que usamos manteiga no refogado), até que os cogumelos ficassem douradinhos. Aí retiramos os cogumelos da caçarola, colocamos água fervendo na panela e o um pouquinho de sal. Acrescentamos o pacote de macarrão (gnocchetti) e acertamos a água até cobrir rente ao macarrão. Quando o macarrão ficou pronto, ao dente,  e com um pouco da água farinhenta,  colocamos os cogumelos de volta  com a manteiga de "trufas brancas". As medidas daquele dia: 500 g de shimeji fresco, 400 g de cogumelo paris fresco, 500 g de macarrão gnocchetti, uns 4 dentes de alho, 1 pimenta vermelha e mais ou menos 2 colheres de sopa da manteiga de cogumelos." Hermano e Manoela 



Fritada de mandioca

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Ainda falta colher limão e banana no sítio para eu sentir que está completo. Mas o mandiocal já está assim. Quando tiver fartura destes três itens vou ser a pessoa mais feliz do mundo.  Se bem que ainda falta o mamão. Então, pronto, limão, banana, mamão e mandioca.  Esta pequena produção já me bastaria. Falta pouco.

Pelo menos em relação à mandioca não posso mais reclamar. Tem bastante agora, vinda de diferentes lugares. Da branca e da amarela para a sopa da dona Olga, para os bolos ou à guisa de pão. Às vezes um tanto cozido sobra e é preciso inventar.

Dentro daquele princípio de improvisar algo para almoçar sozinha, quase tudo cabe no amálgama de um ovo. E desta vez foram as mandiocas cozidas e esquecidas na geladeira que entraram em pedaço como se fossem batatas de uma tortilla espanhola. Bastou fritar fatias de cebolas em azeite e juntar sobre elas ovos batidos com fatias de mandioca cozida. Temperei com sal e pimenta, deixei cozinhar dos dois lados e nhac com salada. Prato completo, sem nenhuma nostalgia das batatas.  Se não sabe fazer tortillas ou fritadas, veja aqui.


Pomar espontâneo

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Antes de vir para o escritório passo sempre pelo jardim e me certifico se a estaca de flor de sabugueiro brotou, se a estufinha do manjericão está funcionando, se o limão transplantado não sentiu, se a semente de tagete germinou. São muitos assuntos pendentes e temas mutantes naquele pequeno pedaço de chão. E é isto que sempre me motiva a sair da cama. Um jardim nunca está igual. Por isto gosto de começar hortas e jardins de modo pouco prático. Seria mais fácil pensar num projeto, ir a um viveiro, trazer as mudas e plantar na terra preparada. Aí é só ir manejando, mas trabalho muito não há. Já feito assim, com sementes ou estacas, dá uma mão de obra terrível, mas o prazer de ver estas vidas se materializando (ou espiritualizando) e o espaço ganhando formas não tem preço.

Sementeira improvisada. Aqui ainda estavam pequenas as mudas 
O fato é que era pra ser só uma passadinha rápida pelo quintal, só mesmo pra conferir. Tanto trabalho eu tinha além do hobby. Mas resolvi tentar tirar o abacate que nascia na jardineira. Puxei, puxei, saiu. Puxei o outro. E depois a uvaia, o abacaxi, a pitanga e mais pitanga, e limão, mexerica, cereja do rio grande, nêspera, manga. Tive que encher vasos e replantar tudo. Já mostrei aqui como vou fazendo quando não tenho tempo de plantar as sementes. É um pomar cuspido (como diz Nina Horta) cujas sementes são arremessadas ali às vezes direto da boca, caso das mexericas e pitangas. Outras são depositadas displicentemente. Geralmente são sementes comuns, nada de raridade. Se brotam, bem. Se não, viram composto. E quando brotam não consigo desprezá-las.

Olhe o tamanho dos abacateiros
Depois de trinta e poucos vasos plantados, ainda sobraram 14 mirtáceas diversas de pequenos tamanhos, que estão esperando num pote d´água os vasos e a terra definitivos.  Poderia ter parado aí, mas me animei com um tantinho de cúrcuma para colher. E um pouco de araruta, de gengibre. E mato para arrancar, mudas para separar, estacas para plantar. Depois de 6 horas de cava, agacha, levanta, quando estava pronta para começar a trabalhar de verdade, minha vizinha Ana me chamou pelo muro convidando para irmos buscar seixos que foram jogados perto do clube. Lá fomos nós com sacos e pás e trouxemos mais de 50 quilos na caçamba do carro. Na volta, que tal irmos molhar a hortinha? E fomos lá com um galão de 20 litros e outros menores, desta vez a pé. Fizemos mais uma viagem, pois, com esta seca que castiga, este tanto de água só serviu para evitar a morte dos poejos, hortelãs, couves e manjericões recém-plantados.

E assim tive hoje um dia de jardineira com mãos na terra e não na massa.


Bolinho de goma de mandioca com capim santo e coco no vapor

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Se você acha que este bolinho se parece com o pichi-pichi filipino, saiba que não é mera coincidência, ele foi inspiração. Quase um verdadeiro, com algumas pequenas modificações. Se você nunca comeu um pichi-pichi de verdade, saiba que eu também não. Mas desconfio.

Agora, não posso deixar de dizer que o empurrão maior foi uma coisa que o amigo Hermano, de Fortaleza, me disse no meio de uma conversa, sobre seu desejo de fazer uma bala de goma mais densa do que a que ele já tinha feito com goma de mandioca. Disse que precisaria ficar mais tempo no fogo apurando. Aquilo ficou na minha cabeça. Como fazer uma mistura de líquido e amido bem concentrada sem que precisasse cozinhar no fogo, mexendo? Pois se a mistura é muito densa, vira um grude difícil de mexer. Eu já testei.

Fui então pesquisar doces de goma asiáticos e caí no pichi-pichi, uma sobremesa popular e apreciada nas Filipinas. É feita com mandioca ralada, açúcar, água ou leite de coco. Mas já vi também feita com o próprio amido (não parece ser o mais comum). Para dar cor, geralmente verde,  costuma, neste caso,  juntar essência e corante de pândano que dá aos bolinhos aquele tom bonito verde radiante que contrasta com o coco fresco com o qual é envolvido depois de pronto. E cozinham no vapor. Aí está o segredo.

Para a inspiração em par ficar completa, me lembrei das tapiocas verdes feitas pela Manoela, mulher do Hermano. Ela faz com capim santo batido (nunca o chá, pois não conserva a cor). Bate no liquidificador com água e hidrata o polvilho com este líquido coado. Aqui em casa ela serviu com geleia, mas contou que gosta de rechear com coco. Bem, que coco combina com capim santo ninguém pode duvidar - basta lembrar de tantas receitas tailandesas deliciosas. E como não tenho pândano, vai de capim santo mesmo.

E pronto, fui assim construindo o bolinho de goma - uma sobremesa densa, gelatinosa, translúcida, naturalmente verde e saborosa - foi só bater o leite de coco com algumas folhas e espremer num pano. O verde se manteve.  E ficou muito bom este pichi-pichi de capim santo. Não consigo parar de comer. Testei cozinhar em forminhas de silicone, de alumínio redonda e quadrada. Todas deram certo. Depois de vinte e cinco minutos os bolinhos estarão translúcidos e a superfície não gruda nos dedos. Se não estiverem assim, é só deixar mais um pouco. Em nenhum caso precisei untar.  Eles são tão grudentos que basta despregar um pedaço com uma ponta de faca e desgrudar o restante puxando com com os dedos. E isto deve ser feito enquanto ainda estão mornos. Ou assim que conseguir pegar as forminhas. Passando no coco ralado fresco em seguida é como se serve o pichi-pichi verdadeiro. Mas aqui podemos também cortar em quadradinhos e passar no açúcar cristal para fazer balas de goma. E se não tiver forminhas, use uma formona e corte em pedaços. Já estou cá pensando em mil variações. Por enquanto, fique com esta receita e varie você também.



Pichi-pichi de capim santo ou Bolinho de goma de mandioca com capim santo e coco no vapor 

Bata 1 xícara de leite de coco com 20 folhas de capim santo bem picadas. Coe num pano. Meça uma xícara  deste leite de coco verde (se teve perdas, junte um pouco de água pra completar) e coloque numa tigela. Junte 1 xícara de polvilho doce (amido de mandioca ou goma) e 1 xícara de açúcar. Misture bem e despeje em forminhas - não precisa encher, se a forminha for alta, embora o bolinho não cresça. Cozinhe no vapor até que fique translúcido. Desenforme e passe em coco fresco ralado.

Mais fotos do passo-a-passo dos três jeitos que fiz:










A balinha para o Hermano


Bolinho de mandioca com coco no vapor. Ou puto filipino. Quinta sem trigo

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Quando você mergulha do mundo dos bolinhos grudentos asiáticos é impossível sair (do mesmo jeito). Tem ali uma cola que te puxa para criações incríveis a partir da nossa raiz. Tudo tão familiar, mas tão diferente ao mesmo tempo, nos detalhes.

Acostumados a domar o grude do amido do arroz e a tirar proveito dele,  os asiáticos ampliaram suas opções de bolinhos pegajosos com nossa mandioca. E há hoje tantos bolinhos de vapor ou de forno feitos com mandioca que dá uma felicidade enorme saber que podemos reproduzir quase todos eles, já que se há um ingrediente que temos em abundância ele é a mandioca. De resto, muito coco, açúcar e às vezes alguma especiaria. Nada desconhecido.  

Estes bolinhos nas Filipinas são chamados de puto. E há puto para todos os gostos. Feitos tradicionalmente de arroz, recebem especificações quando feitos com mandioca, quando cozidos em bambus, na folha da bananeira, de uma região específica etc. Em comum, são todos feitos no vapor e apresentam uma textura pegajosa - menos, porém, que o pichi-pichi, que mostrei ontem.

Pichi-pichi 
Estes putos se parecem com o nosso cuscuz de massa de mandioca ou com a bijajica, que leva também amendoim. Só é diferente o molde de fazer e o jeito de servir - às vezes com um pouco de manteiga e uma pitada de açúcar mascavo no topo. Pode também ser todo empanado em açúcar mascavo. Ou a própria forminha de cozinhar no vapor pode ser besuntada com manteiga derretida e polvilhada com açúcar mascavo. Na massa também pode ir açúcar branco ou mascavo. 
Misturei um pouco os dois jeitos, dos putos e do nosso cuscuz de mandioca e adicionei erva-doce para dar um ar mais brasileiro.  

A mandioca espremida tem que ficar apenas úmida e solta 
A mandioca tem que ser bem espremida até resultar numa farinha úmida e solta, para o bolinho ficar mais fofo. Se você conseguir fazer isto em casa usando um tipiti ou  uma prensa, bem. Se não, é melhor comprar a massa pronta em feiras-livres, com vendedores de produtos de mandioca, como é o caso do Manuel. Espremer no pano é uma opção, mas tem que fazer isto aos poucos. Rale bem fino a mandioca e vá espremendo em pequenas porções para a massa ficar bem sequinha. 

Os bolinhos podem ser comidos quentes, mas também ficam ótimos mornos e frios. Bons para servir com café ou para carregar por aí como se fossem barrinhas de cereais (sem trigo, rico em fibras, sem gordura e com açúcar diminuído se quiser). 

Os ingredientes
Pode variar os moldes. Não precisa untar
Depois de cozidos no vapor, ficam translúcidos
Bolinho de mandioca com coco. Ou puto filipino. 

Meio quilo de massa de mandioca espremida 
6 colheres (sopa) de açúcar branco ou mascavo 
1 xícara (130 g) de coco ralado fresco 
1 pitada de sal 
1 colher (café) de erva-doce

Misture tudo muito bem e espalhe sem apertar por forminhas que podem ser forradas ou não com folhas de bananeira. O link em que mostro como lidar com a folha está lá embaixo. Cozinhe no vapor por 20 a 30 minutos a depender do tamanho do molde. Fiz algumas variações, conforme se vêem abaixo. 

Fiz um na concha do coco e ficou mais parecido com cuscuz. Levou mais
tempo. Melhor se a concha fosse furada

Desenforma fácil

Na concha do coco com folha de bananeira. Dá um sabor especial 

Seja qual for o molde, não precisa untar

Se usar folha de bananeira, pode servir assim, com manteiga no topo
Ou pode desenformar e usar a folha como suporte 
Assim
A massa não deve ser apertada para que fique fofo. E nhac!

A receita de bijajica está aqui



O jeito de lidar com a folha de bananeira caso queira usar, está aqui



Rolinho frito com folha de mandioca

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Folha de mandioca cozida, mandioca cozida e espalmada, pimenta e jambu

Sempre quis ter muitas folhas de mandioca pra fazer testes. Agora, finalmente tenho. O que falta é só o tempo. Mas entre uma coisa ou outra, vou experimentando.

No Brasil não é muito hábito comer as folhas, a não ser na maniçoba paraense, que exige longas horas de cocção. Sabe-se hoje que mesmo as folhas da mandioca brava não precisam ser cozidas por tanto tempo. Uns 30 minutos bastariam. Mas o longo tempo de cocção ajuda a quebrar as fibras e deixar o prato com uma textura cremosa.  Em Belém, no Mercado Ver o Peso, a folha é vendida já triturada e costumam ser expostas em grandes bacias ou já dentro de saquinhos.

Em vários outros países da África e Ásia, no entanto, as folhas da mandioca são cozidas pelo tempo de amaciar, cerca de 20 ou 30 minutos, dependendo da juventude das folhas. Elas são usadas mais largamente e vendidas já trituradas ou cozidas, frescas ou congeladas, prontas para o uso, como estas nas Filipinas.  Elas são boas fontes de ferro, de fibras e minerais. Não dá pra desperdiçar. Então, pra começar, fiz uns rolinhos com a mesma massa para empanar que usei nos rolinhos com folha de capuchinha. Se ficou bom? Não vou nem contar pra não perder o meu estoque de folhas do mandiocal.

Não sei onde poderá comprar, mas tente encomendar de quem vende mandioca ou plante uma maniva numa praça perto de você. Ou, quem sabe, na calçada, no vaso. Se não der mandioca, ao menos, terá as folhas uai.


Há cerca de um ano plantamos no sítio 
Agora, um mandiocal cheio de folhas
Rolinho frito com folha de mandioca

Cozinhei as folhas por 20 minutos com o talinho em água levemente salgada. Quando ficou pronta, puxei o talo para tirar as folhas individualmente. Escorri bem e apoiei numa esteirinha de bambu.

Cozinhei mandioca em água salgada, escorri, peguei um pedaço e abri entre duas folhas de plástico até ficar com espessura fina - veja foto lá em cima. Coloquei sobre a folha, temperei com sal e pimenta-do-reino, coloquei por cima umas tiras de pimenta e um pouco de jambu aferventado em água salgada (pode ser na mesma água da mandioca, já no final).

Enrolei, polvilhei com farinha de trigo e passei na mesma massa que usei para os rolinhos de folhas de capuchinha. Procedi da mesma maneira até o nhac.



Fotos do mutirão da horta no outro blog

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http://hortacitylapa.blogspot.com.br/2014/05/mutirao-na-horta-city-lapa.html

O que é, o que é?

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Razoavelmente fácil, hem? Mas, vamos lá, quero saber tanto se você conhece como como come.

Falaremos disso na segunda. Bom fim de semana!

Maria Pretinha. Ou Black Mary, a nossa blueberry

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Tudo bem que eu disse que a charada estava fácil, mas não pensei que só a Cristina acertaria. Tudo bem também que eu fui um pouco ardilosa em colocar as frutinhas dentro de um micro almofariz de modo a enganar sobre o tamanho. Mas, como não sou de toda sacana, coloquei junto a planta com flor. Ok, meio desfocadas, mas a dica, quando há, tem que estar na entrelinha, se não não é charada, né não?

Então, pronto, faz tempo que estou pra falar da maria pretinha, que todo mundo conhece e muitos de nós comeram a frutinha quando era criança. Com o tempo a gente vai acumulando medos espalhado por um ou por outro. Culpam-na de venenosa só porque tem lá uns alcalóides do tipo solanina, parecidos ao que aparecem no tomate, na berinjela, etc.

Mas se você consultar fontes seguras como Harri Lorenzi, Valdely Kinupp (veja a tese dele sobre plantas alimentícias não convencionais aqui) ou o livro "Black Nightshades: Solanum Nigrum L. and Related Species", de  Jennifer M. Edmonds, James A. Chweya (que pode ser consultado aqui), vai ver que a planta é comestível e tem histórico de uso na alimentação.  Só se deve evitar os frutos verdes e as folhas cruas - na Ásia e na África as folhas são consumidas como verdura. Os frutos maduros são agradáveis, ricos em vitaminas, minerais e nutracêuticos como a antocianina - assim como as uvas, jabuticabas e blueberries -, que lhe dá o tom arroxeado.

Quanto à classificação taxonômica, não ouso afirmar que a espécie que tenho é a Solanum americanum (quase certo que seja), pois depois de ler o livro citado acima, não ouso ser categórica, já que tanto a S.americanum como a S. nigrum podem ter variações na folhagem.  Sorte que as duas,  espalhadas por todo o continente americano, são muito similares e não há risco de confusão já que ambas são comestíveis.

Elas são classificadas como ervas-daninhas e duramente castigadas quando aparecem onde não deviam estar - especialmente nos roçados de feijões, cafés etc. Mas, sorte minha, nasceu no meu quintal espontaneamente. No início, até achei que fosse um pezinho de pimenta cumari, pois se parecem na juventude. Aliás, são parentes. Só para citar alguns da família: camapu ou fisalis, tomate, pimenta, pimentão, batata, berinjela, jurubeba, jiló, lobeira.  Bem, as florezinhas brancas lembram as da pimenta cumari. Mas logo vieram as bolinhas. Cuidei como pude e levei para nosso sítio. É lamentável dizer mas todas as ervas "espontâneas" que hoje lá estão foram levadas daqui, pois toda a terra era tomada por braquiária, que subjuga todas as demais espécies.  Plantei a maria-pretinha do lado de fora do viveiro e agora não dou conta de tanto colher frutinhos. Eles são pequenos e agrupados em cachos como se os talinhos fossem hastes de um guarda-chuvas nu. A planta adorou o lugar, se espalhou, frutificou e as formigas não comeram.

Com ela já fiz geleia como faria de amora. Com umas gotinhas de limão, a cor fica ainda mais vibrante, mas não tem muita pectina. Com maçã deve ficar muito mais firme. Fiz também compota - só cozinhei os frutinhos em calda rala. Dá pra usar como calda para tortas e sorvetes. Mas o que mais gosto mesmo é acrescentar à massa de panqueca, principalmente se elas forem de massa mais grossa.

No domingo fiz as panquecas para o café da manhã e realmente dá pra pensar que são de blueberries. Mas que blueberry, que nada. Poderiam chamar, apelando para vender, de black mary, ou little blackmary, como sugeriu o Marcos.  Mas é como maria-pretinha que todo mundo por aqui a conhece, embora haja outros nomes como garaquinha, araxixu, caraxixá e erva-moura, entre outros, segundo H. Lorenzi. Não, em inglês não é blackmary, mas black nightshade, nome comum a espécies relacionadas, que também gera confusão. E, não, não adianta me perguntar onde vende. Saia observando nas ruas e terrenos baldios. Recolha frutinhos e plante em vasos ou no jardim (Suzana, minha irmã, diz que tem na jardineira).

Sorte que já tinha feito e tirado foto outro dia, pois separei umas panquecas lindas para fotografar e servi as outras. Avisei minha irmã que eram pra foto, mas antes de almoço, achando que eu já havia fotografado, ela não resistiu e acabou com a possibilidade de você ver aqui a foto de panquecas mais apetitosas que estas que apresento. Segundo ela, o gato atacou primeiro.  Bem, sinal que gostaram. Mas encontre maria-pretinha por aí e faça a sua própria versão. Aqui a receita da minha - uma panqueca normal com um pouco mais de farinha e açúcar.

Quentinha com manteiga. Nhac! 

Panquecas com maria-pretinha 

1 xícara de leite
1 ovo
6 colheres (sopa) de açúcar
1 pitada de sal
1 colher (sopa) de manteiga
1,5 xícara de farinha de trigo
1 colher (chá) de fermento em pó
1/4 de xícara de maria-pretinha lavada e seca

Bata todos os ingredientes, menos a maria-pretinha, no liquidificador, junte as frutinhas,  e cozinhe uma colherada (de servir) de cada vez, em frigideira antiaderente, deixando dourar de um lado e depois do outro.

pra 6 pessoas (mais que uma por cabeça)

Mais fotos: 

Os frutos, só maduros. As folhas, só cozidas 

Minha irmã Suzana. Colheu e comeu



Geleia: sem muita pectina. Funciona como uma deliciosa calda 
Em compota, sobre manteiga sobre pão. Nhac!










Seria tempo de pinhão

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Neste fim de semana caminhei durante mais de uma hora por um deserto que responde também pelo nome de "floresta comercial". 

Esta  floresta de eucalipto, que se estende até o topo do morro, estava na fase de corte.  E não é só corte, afinal a planta,  que nada tem a ver com o mau manejo que o homem lhe oferece, tenta brotar, se regenerar, mas vem um mata-espécie potente e acaba com sua graça e sua raça. E com tudo que tem a desgraça de estar em volta dela. Nenhum ser vivo sobrevive nesta "floresta". Não só a rebrota seca com cor de fogo morto, mas tudo o que está sobre a terra já exaurida. Não se vê um pontinho verde, um que respire ou outro que se mova. O silêncio é esquisito e é estranha esta floresta de uma espécie só  - ou nenhuma como é o caso agora. Para tentar compensar e se obter mais lucro plantando novas mudas, sacos e sacos de fertilizantes são despejados na terra pedregosa. 

Do outro lado, não muito distante, ainda há cantarolar de água correndo com uma paisagem colorida e diversa com manacás, muricis, caetés, quaresmeiras, jasmins, samambaia-açu, canto de pássaros e barulho de bugios. Aquilo sim, resto obrigatório talvez, é um pedaço mínimo de floresta, como todo o entorno foi um dia. No lado desértico, algumas árvores insistiram em ficar mas não sabem até quando resistem. 

Havia uma embaúba com cicatrizes de machadadas na base, uma paineira já sem forma e algumas poucas araucárias esqueléticas, jogando no chão pinhões minguados que não encontram sequer uma gralha faminta para enterrá-los.  

Pelo caminho poeirento e desértico, algumas grotas secas indicam que houve ali um dia uma nascente.  E estas fotos de Piracaia servirão pra provar que um dia houve um pé de pinhão na Serra da Mantiqueira. E que houve um dia que colhíamos pinhão pra comer na fogueira. Definitivamente isto não pode ser chamado de floresta.






 

Tinta de lousa fácil pra cozinha e hortas urbanas

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Quem me deu o caminho foi a amiga e leitora Ana Laura. A receita está lá no Manual do Mundo, de um maluco que ensina em vídeo muitas coisas legais e úteis.  Entre elas já testei a tinta de vidro, uma beleza, e esta de lousa, afinal temos deixado vários recados na horta comunitária. Claro, já existe a tinta pronta, mas você pode não precisar de um pote inteiro e pode gastar muito menos além de  guardar os ingredientes para misturar quando quiser pintar apenas um pedaço de papelão. Ou dividir com a vizinha (de vez em quando empresto meu kit pra minha vizinha, outra Ana,  e ela repõe a cola por gentileza, que nem precisava). Você pode encontrar estes ingredientes em qualquer loja de materiais para construção.  Já usei como suporte jogos americanos de plástico - estes são ótimos para pendurar em postes. E papelão, tábua, azulejo, balde.  Dá pra pintar uma parede inteira na cozinha, deixar um recado no quintal, decorar a sala com desenhos, fazer graça. E se você tem talentos, poderá deixar sua cozinha linda, como podemos ver aqui

De minha parte, tenho usado para deixar recadinhos na horta e na porta de casa, como por exemplo "mudas de jabuticabeira, pode levar" (desta não tirei foto) ou limpar uma viela viciada em entulhos e colocar um lembrete para não jogarem  lixo ali  (funcionou!), para regarem a hortinha com água de lavagem de verdura etc. Enfim, tenho usado para fins utilitários mesmo. 

Como se faz: basta misturar um pouco de pó de rejunte cinza (ou qualquer outra cor que combine com o tom que você quer) com cola branca até dar o ponto de massa de panqueca. Aí é só ir acrescentando pigmento para tinta na cor preta e misturando. Escolha a superfície e use uma esponja de espuma para espalhar. Deixe secar por um dia à sombra. Se houver sol, em poucas horas já poderá usar. Para apagar, use um pano úmido. E, pra deixar no tempo, tenho usado giz de cera. 

Mas não deixe de ver o vídeo

Algumas fotos: 




Bolinho cremoso de mandioca com cenoura no vapor. Quinta sem trigo

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Sim, eu sei, quando encasqueto com uma coisa, você chega a enjoar. Estou na onda dos bolinhos de mandioca que descobri na cozinha filipina, como o puto e o pichi-pichi

Agora resolvi acrescentar cenoura à massa e ficou com gosto de cocada cremosa e ligeiramente grudenta. Alguns, cobri com coco fresco, uns, com coco queimado e outros, com farinha de coco - que você pode fazer em casa, como mostrei aqui

Aqui vai, então, a receita. O jeito de fazer é igual aos dois outros citados. 



Bolinho cremoso de mandioca com cenoura no vapor (sem trigo, sem ovos, sem leite, sem glúten, sem lactose.... mas cheio de graça) 

Bata no liquidificador 1 cenoura de 80 g com 200 ml de leite de coco até ficar cremoso. Passe para uma tigela e junte 1/4 de xícara de açúcar, 1 pitada de sal, 1 pitada de erva-doce e 1 xícara de massa de mandioca (mandioca ralada fino e bem espremida em pano até virar uma farinha úmida e solta  - pode comprar em feiras livres quando há vendedor de mandioca e seus produtos) - ou veja aqui outro jeito de conseguir.   Misture bem e coloque em forminhas de empada, pela metade - se encher, a massa pode inchar e entornar. Cozinhe no vapor, com um pano entre a tampa e a panela para absorver a umidade,  por cerca de 30 minutos ou até que a massa fique firme e translúcida.  Desenforme passando a faca na lateral. 

Rende: cerca de 20 bolinhos 

Dendê e camarão

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Cabeça de camarão seca no forno e triturada vai pro vatapá
Cabeça de camarão a gente não joga fora, não. Assa, tritura, vira tempero pra vatapá com dendê, castanha, gengibre, leite de coco etc. Se a cabeça é boa, o corpo, melhor ainda. Nem pra todos. Se cai um camarão no chão é com dó que a gente dá pro cachorro que, normalmente, devora-o. Alguns.

Mas cachorros têm lá suas idiossincrasias. Minha Dendê, por exemplo, a viralatinha filha de uma cadela, tem aflição de bicho com corpo inteiro. Da Içá, prefere o corpo, coloca pra fora do prato todas as cabeças que arranca ela mesma. Já do camarão, não quer saber do bicho com corpo carnudo. Prefere o cérebro com olhos crocantes e antenas longas. Vai entender a cabeça do bicho.  

Vou amanhã pra Belém, participar do Festival Ver-o-Peso de comida  paraense. Depois, Ilha do Marajó. Estarei de volta lá  pro dia 10 contando as coisas de lá.  http://www.veropesodacozinhaparaense.com.br/v2014/index.php

Até lá, divirta-se um pouco com a Dendê.



Cenas de Belém

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Estou em Belém a convite do Festival Ver-o-Peso da cozinha paraense e da Embrapa e desde que cheguei, na terça à noite, não parei ainda de conhecer, rever, comer, me surpreender. Acho que esta é a sexta vez que passo por aqui e sempre há o que aprender. Já jantamos no ótimo Santa Chicória, da chef Ilka, almoçamos no restaurante de beira de rio, Maloca do Orlando, ao qual só chega de barco, fomos ao coquetel de abertura no restaurante do Tiago, Remanso do Bosque, almoçamos no restaurante Dom Giusepe, visitamos a feira Ver-o-Peso, conhecemos o chocolate da Nena, da Ilha do Combu e terminamos o dia de hoje com comida de boteco feita por vários chefs no Boteco Veropa. No meio disso tudo ainda sobrou tempo para participar do fórum técnico sobre mandioca onde falei junto com especialistas sobre este tema apaixonamente e pude provar o tucupi preto e o pajuaru de Roraima, feitos por dona Kalu, filha de mãe índia. Mas do dia de hoje falo amanhã. Por hoje, fique com as fotos de ontem, do Ver o Peso, da Maloca do Orlando, do próprio Orlando, sua cozinha e o trajeto pra se chegar lá - em vez de rua, rio; em vez de prédios no caminho, floresta. Pra ir ao restaurante, e eu indico muito, é só ir em alguma agência de turismo ou pegar um barco até lá.


Mercado de carnes

Mingau de farinha, água, sal e manteiga - esquenta, diz a vendedora


Pimenta de cheiro

Camarão seco de todo tipo

Tucunaré
Açaí com gelo,  farinha de tapioca no Orlando
A polpa virou suco, maravilhoso. A semente seca pra fazer chocolate. Cacau.
Pupunha
Biribá
Caranguejo e casquinho de caranguejo




Biribá, cacau, sapoti


Pupunha cozida

Bananas e coquinhos



Ingá chinela

Triturando a maniva (folha de mandioca) para a maniçoba


Folha de mandioca triturada

Priprioca



Frutas no barco

Sala do Seu Orlando e dona Cici


Maloca do Orlando


Seu Orlando




Seu Orlando extrai o açaí na hora



No caminho, população ribeirinha




caranguejo e casquinho de caranguejo

Só uma pequena amostra



Cozinha do seu Orlando, limpíssima

Pacová, o nosso cardamomo. Coluna do Paladar, edição de 05/06/2014

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Pois é, voltei. Toda picada de micuim de búfalo, mas voltei do Marajó. Não consegui postar durante a viagem, de modo que sobrou muita coisa interessante pra mostrar, mas antes preciso organizar as lembranças. Enquanto isto, a coluna do Paladar da última semana. Há tempos queria falar do nosso cardamomo, mas desejava antes ter a oportunidade de conhecer a planta, o que aconteceu há alguns dias. No jornal, o link é este: http://blogs.estadao.com.br/paladar/pacova-para-comer-e-para-perfumar/. Mas aqui reproduzo o texto original, mais fotos do passeio de coleta e uma receita de bolo e outra de açúcar, exclusivas para o blog.  E amanhã tem Pará. 



Pacová 

Até hoje não sei de onde vem a expressão “não me enche os pacovás”, mas ouvi tanto quando criança que resolvi ver no dicionário se pacová era sinônimo de paciência. Um tipo cardamomo brasileiro era a descrição do verbete. Cardamomo, a especiaria indiana muito aromática, só vim a conhecer mais tarde. E, ainda assim, antes de ver um fruto seco do nosso pacová, que descobri em bancas de ervas medicinais não tem muito tempo. Já a planta em flor e com frutos frescos, conheci só há alguns dias.


Em tupi-guarani, pacová quer dizer folha enrolada, daí a profusão de plantas com este mesmo nome popular, incluindo a banana-da-terra, um tipo de alpínia e outro filodendro comum nos viveiros. Mas o pacová de que falo é aquele mesmo dos dicionários, Renealmia exaltataparente do cardamomo, cujas sementes são repletas de óleos essenciais. Na China, há um tipo parecido que costumam defumar para usar em pratos salgados.

A planta está presente em quase toda a América tropical e às vezes cultivada como planta ornamental.  E, como resiste a algum tempo de seca e até a frio intenso, pode ser encontrada em todo o território nacional, preferencialmente no interior de bosques em terrenos úmidos e sombreados. 


O que fiz há alguns dias foi ir atrás dos frutos em seu ambiente natural. Quem me guiou foi Carlos Gomes, que nasceu em Piracaia, interior de São Paulo, e conhece todos os matos e plantas medicinais. Andamos mais de uma hora por trilha até chegarmos ao local onde havia uma reunião de pacovás com mais de metro de altura e folhas parecidas com a de alpínias, galangas ou lírios do brejo.  Numa mesma planta havia lindos cachos de flores rosa forte e frutos, alguns ainda vermelhos como grãos de café, outros mais velhos, já púrpuras como jabuticabas e uns poucos enegrecidos e secos, prontos para usar.  A maioria dos frutos, no entanto, Carlos já havia colhido na maturação coletiva da semana santa. Em sua varanda, há várias pencas de pacovás de cabeça pra baixo secando presas ao madeirame do telhado. 


Algumas pessoas da cidade ainda usam as sementes como medicamento para dor de estômago e má digestão, como em todo o Brasil, mas conhecer a planta quase ninguém conhece e Carlos se orgulha de saber o dia certo de ir colher. Segundo ele, a planta guarda um mistério, pois a maioria dos frutos amadurece exatamente na semana santa, não importa ela se caia em março ou abril. E nesta mesma época as flores estarão desabrochando para dar vida a novos pacovás que levarão um ano para amadurecer. 



E usar como condimento na cidade também ninguém usa, ao menos que se saiba.  Eu conhecia o sabor e o perfume dos cardamomos comprados nas lojas de plantas medicinais e já havia usado em receitas no lugar do cardamomo. Mas agora, com vários frutos em mãos, colhidos no pé, parece que são ainda mais parecidos com o cardamomo – as plantas são parentes, ambas zigimberáceas como o gengibre. Certamente na composição de um de outro vários componentes do óleo essencial coincidem.


A casca arroxeada também é usada como medicamento e produz um chá avermelhado quando o fruto está maduro e foi recém-colhido. Em volta das sementes,  os arilos alaranjados são fiapentos e tornam-se um pouco mucilaginosos quando mastigados. Não são gostosos, mas são comestíveis, podem colorir e perfumar arroz e os jacus adoram.  Já as sementes também não são gostosas para comer, como não são o anis estrelado ou um dente de alho, mas na comida, em pequena quantidade, dão sabor e aroma. E mastigadas, elas produzem uma ótima sensação refrescante, deixando o hálito perfumado.


Se nunca provou, procure em casas de produtos fitoterápicos. Experimente uma semente e logo sentirá o sabor pronunciado não só lembrando o cardamomo, mas também algo cítrico e mentolado. E, assim como o cardamomo, o pacová pode ser usado para aromatizar o café, moendo um pouco das sementes junto com os grãos. Ou  para compor mistura de especiarias – triturado com pimenta-do-reino, cravo e canela, por exemplo, para usar em carnes, frangos e vegetais. Para pratos doces, basta socar no pilão um pouco das sementes com açúcar, peneirar e usar em chás aromáticos, bolos, biscoitos de especiarias e docinhos como este de fécula de mandioca, em que tem seu lado cítrico incrementado pelo capim santo.  




Doce de goma de mandioca com capim santo e cardamomo


Ingredientes

1 xícara de leite de coco

As sementes de 2 frutos de pacová socadas

10 folhas de capim santo picadas

1 xícara de açúcar

1 xícara de polvilho doce (fécula ou goma seca da mandioca)

½ xícara de coco ralado


Modo de fazer:  bata no liquidificador o leite de coco com o pacová e o capim santo até ficar bem triturado. Passe por um pano e esprema bem. Volte o líquido verde para o liquidificador com o açúcar e o polvilho. Bata até homogeneizar. Espere meia hora, bata de novo e distribua a mistura por forminhas de empadas de alumínio pequenas, ou de cupcakes de silicone – coloque a massa só até a metade da altura da forminha. Não precisa untar nenhuma delas.  Cozinhe no vapor por cerca de 20 minutos, com um pano entre a panela e a tampa, para absorver a umidade e não molhar o docinho. Estará pronto quando ficar translúcido e a superfície não grudar nos dedos. Desenforme ainda quente passando uma faca na lateral e puxando. Passe por coco fresco, espere esfriar e sirva.  Se preferir, espere esfriar, corte em pedaços e passe por açúcar – ficam como balas de goma.


Rende: cerca de 30 docinhos



Receita do Bolo de aveia com pacová 

1 xícara de manteiga 
2 xícaras de açúcar mascavo 
1 xícara de farinha branca 
1 xícara de farinha integral 
1 xícara de aveia 
2 xícaras de leite 
1 colher (chá) de bicarbonato
1 colher (sopa) de fermento em pó 
1 pitada de sal 
1 colher (chá) de noz moscada
2 bagas de pacová e 2 dentes de cravo socados com 1 colher (sopa) de açúcar e peneirados 
1 colher (sopa) de canela em pó 
2 xícaras de maçã descascada e picada 

Bata manteiga e açúcar até formar um creme e junte aos poucos os outros ingredientes. Asse em formas untadas. 


Açúcar de pacová 

Soque e peneire açúcar e sementes de pacová a gosto. Use o açúcar para adoçar chás, cafés, refrescos e drinques.  O arilo amarelo pode ser usado para tingir arroz. 

Outras fotos

Carlos e Silvana
Carlos entrando no bosque
O botão demora 1 ano pra virar fruto
O fruto imaturo
Fruto maduro
Quase dois metros
O ambiente

Ao redor tem líquem

E bastante água - Silvana bebe um pouco de água fresca na folha de caeté

E tem musgos e cogumelos
Marcos aproveita pra balançar num galho de limão zamboa 

Chocolate da Ilha do Combu. Belém do Pará 1

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Pois é, quem acompanha o blog já sabe que estive em Belém, no Pará,  a convite do Festival Ver o Peso e da Embrapa (participei de um fórum técnico sobre mandioca e dei palpite na comida de uma boieira).

Para muita gente que foi, chefes e jornalistas, o assunto já parece velho, porque as notícias e fotos foram circulando ao vivo pelas redes sociais, como um jet ski barulhando ondas. Mas, como meu único canal é este, tenha paciência que vou contando aos poucos, no ritmo da canoinha a remo direto dos igarapés.

Entre tantos passeios e comidas boas que tivemos em Belém, a visita à ilha do Combu era a mais esperada. Já conhecia o chocolate Filha do Combu quando uma vez ganhei do Thiago Castanho, no Paladar. Achei tão incrível, que não comi. Experimentei e guardei na geladeira da posteridade (sim, eu tenho uma geladeira só pra pérolas). Agora, já posso comer aquele e os mais novos pacotinhos que trouxe de lá.

Dona Nena é quem faz estas poquecas de cacau numa ilha do distrito de Outeiro, chamada de Combu, quase de fronte ao Mercado Ver o Peso, em Belém. Já tinha visto fazer chocolate artesanal em Ilhéus muitos anos atrás. Mas lá colocavam açúcar. Na Bahia inda se faz muito com ou sem açúcar. Já Dona Nena (Izete dos Santos Costa), faz do jeito que aprendeu com o pai. De fato, não foi um aprendizado continuado. Ela precisou recuperar a receita que já não sabia mais executar e não é mais comum no Pará. Errou um pouco até chegar ao perfeito grau de torração e ao moinho ideal para triturar (um moedor manual de cereais, igual àquele que uso para fazer tortillas mexicanas). O processo é trabalhoso, mas fácil de entender quando ali é possível acompanhar todos os passos, já que a produção é pequena, feita numa pequena cozinha. O cacau vem do quintal, uma linda floresta à beira do rio. O grão é despolpado, fermentado, seco, torrado, despelado à mão - acho que é parte mais trabalhosa, feito grão a grão,  e triturado. A pasta gordurosa e cremosa que saí do moinho logo endurece,  por isto é embalada na folha do cacaueiro enquanto ainda é macia suficientemente para ser moldada. Vem da folha do açaí o amarrilho. Um luxo.

O resultado é a barra perfumada, ligeiramente amarga, cem por cento cacau. Delícia sem igual. Dona Nena produz também brigadeiro feito do jeito clássico, com leite condensado, mas usando seu chocolate amargo triturado. E, em vez de chocolate granulado, nibs de cacau, feitos a partir do próprio grão quebrado miudinho.  Na recepção havia uma garrafa térmica com chocolate quente feito também com o próprio chocolate.

O brigadeiro é assim 
Sugestão minha e da Janaína 
Para seguir o mesmo estilo de embalagem, minha amiga, a jornalista Janaína Fidalgo, pensou na possibilidade de usar a própria folha do cacaueiro também para amparar o brigadeiro. Aproveitei para pedir umas folhas pra dona Nena e não via a hora de chegar ao hotel para testar a ideia. Como tinha na mala, não sei porque, algumas forminhas de pão de queijo pequenas, marquei as folhas de cacau com a tampa do creme nívea, cortei com minha super tesourinha, lavei bem, sequei e coloquei as folhas entre as formas, pressionando para dar o formato côncavo. Para desidratar, coloquei o conjunto na parte de trás da geladeira. Deu super certo. No outro dia, as folhas já eram forminhas, estavam secas e ainda verdes. Acho que dona Nena iria gostar. Pedi pra deixarem algumas com ela, mas não sei se chegou a receber.


Quem quiser saber mais sobre o feitio do chocolate artesanal veja este vídeo de Marion Valadier, uma jovem francesa, namorada do filho de uma amiga,  que veio ao Brasil fazer um estágio numa fazenda baiana em Rio de Contas.  Aqui está o pedaço do filme (eu tenho a versão completa em cd, com cerca de 1 hora):  O grão de cacau, de Marion Valadier. Para ter o filme, compre direto com ela - tem seu contato no Vimeo, aí no link.

Algumas fotos da visita à Ilha do Combu.




 

Perguntei sobre estas mudas que vi num balde no quintal e dona Nena
disse que são os visitantes que põem ali as sementes do cacau que provam





Maloca do Orlando. Belém do Pará 2

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Tem gente que vai pra Orlando e não conhece a Maloca do Orlando, tão mais perto de nós. Está certo, não é logo ali, mas em poucas horas se vai a Belém. E de lá pra Maloca é um pulo. O almoço ali fazia parte das atividades para chefs e jornalistas organizadas pela equipe do Festival Ver-o-Peso da comida Paraense. De Belém até lá se vai de barco, cerca de 40 minutos se não me engano,  ou qualquer outro veículo que se desloque por água, incluindo os barulhentos jet skis. Nosso barco era motorizado mas silencioso e durante o caminho havia apresentação de carimbó e outros ritmos regionais enquanto a paisagem ribeirinha ia passando diante de nossos olhos como um filme. Chegando à Maloca, debruçada sobre o rio Arapari, uma mesa colorida de frutas locais adornada com flores de alpínia púrpura nos esperava. Aliás, acabei de ver que apareço numa foto postada na página do restaurante no facebook falando do evento (veja lá).

Em Belém comi em ótimos restaurantes como o Santa Chicória, Lá em Casa, Remanso do Bosque, Remanso do Peixe, Família Sicília e acho que ainda esqueço algum. Mas comer na Maloca é mais que uma experiência gastronômica porque a paisagem é mágica, a família do Seu Orlando é acolhedora, os ingredientes são fresquíssimos vindos do Ver-o-Peso, e o preparo dos pratos envolve o mínimo de intromissão no que a natureza deu de melhor. Não havia nenhum prato muito elaborado. Camarão no bafo, caranguejo toc toc, peixes como pescada amarela e filhote grelhados, salada, farinha, arroz, feijão, casquinho de caranguejo com farofa crocante por cima e de sobremesa uma tigela de açaí puro colhido na floresta atrás da cozinha e extraído na hora num extrator profissional areado até brilhar  - quando chegamos o açaí estava de molho numa panela. O creme vem acompanhado de gelo e açúcar à parte pra quem quer. Mas não precisa de nada. O açaí fresco lembra azeite bom, abacate maduro. Quando não tão fresco sabe mais à caroço de abacate terroso.

O legal daquela cozinha é que não tem nada mocozado. O ingrediente fresco chega, é preparado e servido. Tudo à mostra, com cozinha aberta, arejada, de limpeza impecável e com mulheres sorridentes trabalhando sem estresse.

Seu Orlando levou alguns de nós para mostrar sua casa. Basta ver as cores da sala e os bibelôs de passarinhos pregados na varanda pra perceber que se trata de uma casa de gente feliz. E comer comida de gente feliz, vamos combinar, deixa a gente mais feliz ainda, não é não?

Então, quando for a Belém, procure na estação das Docas algum passeio de barco que inclua almoço na Maloca, ou vá por conta, contratando um barco que te leve até lá. Mas aí é melhor ligar que o Orlando te explica como chegar.  Ou visite a página do restaurante no facebook.

Maloca do Orlando
Telefone 091 9233-0350

Veja algumas fotos





Brasil verde-e-amarelo

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Não é circunstancial, é intrínseco e amanhã é feriado de Come-se também. 


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